Centro Histórico de Porto Seguro: onde cultura, tradição e resiliência se encontram

O sol queima intenso no Centro Histórico de Porto Seguro, mas é o calor da resistência que aquece as barracas e os corações de quem faz daquele espaço um ponto de vida e tradição. Entre o som do berimbau, o aroma doce do cacau e as cores vibrantes do artesanato, cada vendedor carrega em si uma história de luta, amor à cultura e persistência diante das dificuldades.

O som do berimbau e a força da cultura

Sob a sombra das árvores centenárias, Luarã de Jesus, 34 anos, embala o espaço com os sons do berimbau, fazendo vibrar as raízes da cultura brasileira. Mestre de capoeira e fundador do grupo Gunga IÊ, ele mantém viva uma arte que carrega as marcas da resistência e da luta por liberdade do povo brasileiro. “Capoeira é mais que dança, é vida, é liberdade”, explica com paixão.

Luarã cresceu entre as ruas de paralelepípedos do Centro Histórico e hoje dedica seu tempo a ensinar capoeira aos jovens da região, mostrando que a cultura é uma poderosa ferramenta de transformação. “Quando o turista assiste à roda, ele não leva só o momento, mas um pedaço da nossa história. É isso que nos motiva a continuar”, afirma.

O mestre, no entanto, não esconde as dificuldades. Sem qualquer tipo de incentivo governamental, o turismo é a principal fonte de renda para manter seu trabalho vivo. “Nós dependemos do turista que vem aqui, que compra nossos produtos, que contribui nas rodas de capoeira. Se não fosse por isso, não sei como continuaríamos.”

Enfrentando o preconceito

Apesar de a capoeira ser reconhecida como um patrimônio cultural imaterial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e ter um forte vínculo com a história e resistência dos povos afro-brasileiros, ela ainda enfrenta preconceito e desvalorização, mesmo entre turistas que visitam a Bahia.

Muitos visitantes, mesmo quando a capoeira faz parte do roteiro turístico guiado, demonstram resistência em presenciar as rodas de capoeira. Isso ocorre por diversos motivos, incluindo estigmas históricos e preconceitos ligados à sua origem e à sua associação com a marginalização das populações afro-brasileiras. Durante o período colonial e no início da República, a capoeira foi associada à criminalidade, o que ainda reflete nas atitudes de algumas pessoas, que veem a prática como algo distante da “cultura refinada”.

Estudos de pesquisadores sobre a história da capoeira, como os de documentações feitas pelo Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM) e artigos acadêmicos, revelam que, apesar do reconhecimento oficial e dos esforços para preservar e divulgar a cultura da capoeira, ela ainda enfrenta barreiras sociais. A cultura da capoeira muitas vezes é desconsiderada por turistas que não percebem o seu valor simbólico, que vai muito além do aspecto físico ou esportivo da prática, envolvendo luta, música, dança e uma herança de resistência contra a opressão e o racismo.

Barraca da Maria: arte que emociona

No pequeno espaço que chama de sua “barraquinha”, Erotilda Maria de Jesus, 66 anos, expõe bonecas de pano, panos de prato e outros objetos que refletem sua dedicação e habilidade artesanal. “São 16 anos aqui, trabalhando com amor e esperando que as pessoas levem um pedacinho do que faço para suas casas”, diz Erotilda.

Entre as vendas e os dias difíceis, ela mantém o sorriso e a força de quem sabe que sua arte vai além do objeto em si. “Tem vezes que o movimento não é tão bom, mas eu sigo. É isso que dá o complemento ao sustento da minha vida e minha paixão. Cada peça que faço carrega um pouco de mim.”

Erotilda é o exemplo vivo de como o artesanato não só movimenta a economia local, mas também preserva tradições e histórias que encantam quem passa pelo Centro Histórico de Porto Seguro.

Doçura que transcende gerações

Milena Araújo Santos, 31 anos, transformou a dor da perda em um legado doce e significativo. Após a morte de sua mãe em 2020, Milena decidiu abandonar a carreira de pedagoga para seguir os passos de Luzia, sua mãe, na produção de chocolates artesanais. “Minha mãe começou isso tudo. Quando ela partiu, eu sabia que precisava continuar o que ela construiu. Esse chocolate é a nossa história,” diz Milena emocionada.

Na barraca Chocolate da Luzia, Milena não apenas vende chocolates, mas compartilha memórias e tradições familiares. “Aqui, tudo tem história. Eu aproveito cada parte do cacau porque ele é muito mais do que um fruto, é nossa identidade.” Dividindo seu tempo entre cuidar de suas três filhas e produzir os chocolates com a ajuda do marido, Willian Souza, Milena enfrenta os desafios diários com determinação. “Às vezes, penso em como seria fácil desistir. Mas aí lembro da minha mãe, do que ela sonhou para nós, e isso me dá forças.”

O impacto do turismo na cidade

Porto Seguro, um dos destinos mais visitados do Brasil, continua sendo um polo turístico de destaque, com a previsão de mais de 809 mil visitantes entre dezembro de 2024 e março de 2025, incluindo o período de carnaval. Este movimento evidencia a importância do turismo para a cidade, que oferece uma infraestrutura robusta com cerca de 760 meios de hospedagem e 70 mil leitos disponíveis. A cidade é a terceira no país em capacidade de acomodação, ficando atrás apenas de São Paulo e Rio de Janeiro, segundo dados do Ministério do Turismo

Porto Seguro não só atrai turistas por suas belezas naturais e históricas, mas também por seu rico legado cultural, como o descrito no seu Centro Histórico, onde a arte, a música e a tradição afro-brasileira, representadas pela capoeira e pelo trabalho de artesãos locais, continuam a cativar os visitantes. Com a crescente visitação, é possível perceber como o turismo sustenta e valoriza as manifestações culturais e os empreendimentos familiares, como os de Erotilda Maria e Milena Araújo, cujos trabalhos ressoam profundamente com a identidade e a história da região.

Texto e foto: Letícia Ortolan – JP 7118/SC – Assessoria de Imprensa voluntária

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