Tem coisa estranha no ar — e não é o vento do litoral. Em Porto Seguro, os holofotes se voltam agora para uma investigação relâmpago que parece ter mais capítulos ocultos do que respostas claras. Tudo começou quando o Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Porto Seguro e Região (SINSPPOR) alertou para supostos aumentos salariais “misteriosos” de servidores da prefeitura — reajustes que, segundo denúncias, beneficiariam aliados políticos do atual governo.
Em 22 de julho, o sindicato protocolou o Ofício nº 44/2025, pedindo o óbvio: participar da comissão instaurada pela Portaria nº 095/2025, criada para apurar as irregularidades na folha de pagamento. O pedido, aliás, estava endereçado ao prefeito Jânio Natal, à Secretaria da Fazenda, à Procuradoria do Município e ao Ministério Público da Bahia. A solicitação se fundamentava no princípio constitucional da transparência administrativa e na necessidade de garantir lisura nas apurações.
Mas eis que o enredo ganha tons de ficção: segundo a Prefeitura, não há qualquer registro desse pedido nos arquivos da Secretaria de Administração. Sim, você leu certo — o documento, com cópia para quatro autoridades, simplesmente evaporou. Como mágica.
E o que fez o Ministério Público? Diante do sumiço seletivo da papelada, a 3ª Promotoria de Justiça de Porto Seguro expediu a Recomendação Ministerial nº 002/2025, determinando que o sindicato tivesse direito de acompanhar os trabalhos da Comissão como observador. Transparência, afinal, é o mínimo esperado em uma auditoria pública.
Só que a Prefeitura tinha um “plot twist” na manga: em resposta ao MP, informou que, no dia em que recebeu a recomendação, os trabalhos da comissão já estavam concluídos — com relatório entregue em 6 de agosto, apenas 15 dias após a criação da comissão.
Sete mil contracheques analisados, irregularidades apuradas, conclusões prontas… tudo em duas semanas. Um recorde mundial em eficiência administrativa — ou um espetáculo de prestidigitação burocrática digno de nota.
O mais curioso? Nenhum relatório foi tornado público. Nenhum processo administrativo detalhando a metodologia, planilhas ou documentos comprobatórios foi disponibilizado.
Cadê o processo administrativo? Cadê o relatório final? Cadê as conclusões?
Enquanto isso, os servidores relatam que as distorções salariais — especialmente entre cargos idênticos — continuam. A suspeita é de que os “sortudos” dos contracheques turbinados são apadrinhados do governo municipal, premiados com aumentos fora dos limites legais e muito acima da recomposição inflacionária aprovada em lei.
O SINSPPOR denuncia ainda que, além do prejuízo aos cofres públicos, o caso causa desequilíbrio entre as carreiras, desestimula os demais servidores e fragiliza as negociações salariais legítimas.
“Não há transparência, não há equidade e, pelo visto, há pressa demais para encerrar um assunto que envolve dinheiro público”, afirmou a direção do sindicato, que pretende insistir no acesso aos autos e questionar formalmente a postura da Prefeitura junto ao Ministério Público.
Em tempos de eleição e promessas de “moralidade na gestão”, o episódio levanta uma pergunta incômoda: quem realmente ganhou com essa corrida contra o relógio?
Enquanto a Prefeitura jura que tudo foi investigado e resolvido em tempo recorde, a população e os servidores continuam sem respostas. E, entre planilhas invisíveis e relatórios fantasmas, o que sobra é um velho enredo brasileiro: o erário sangra, a confiança pública se esvai, e a verdade parece ter sido arquivada junto com o ofício que “nunca existiu”.
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